Saturday, September 16, 2006

ALEGRIA TRANSCENDENTE - O SAMBA

Ainda hoje não consigo entender a alegria transcendente que me invade quando escuto bons sambas. Não sei se é uma capacidade espiritual, alguma sensibilidade maior ao que é belo, ou se é algo que veio com minha criação. Lembro-me agora de uma das minhas mais antigas memórias. Eu devia ter uns 5 anos, talvez menos. A sala do apartamento da R. São Clemente, em frente ao casarão enorme da Prefeitura. Um aparelho de som prateado, com aquela tampa de plástico fumê que protegia o vinil. E ali estava Chico. O Chico que marcou minha vida inteira, e continua marcando. A música era "Deixa a menina":
"Não é por estar na sua presença
Meu prezado rapaz
Mas você vai mal
Mas vai mal demais
São dez horas
O samba tá quente
Deixa a menina contente
Deixa a menina sambar em paz
(...)
Por trás de um homem triste
Há sempre uma mulher feliz
E atrás dessa mulher
Mil homens sempre tão gentis"
Claro que naquela época eu não entendia. Só ficava fascinada pelo ritmo, pela cadência das palavras. Hoje entendo bem, até demais. Quantos sambas já frequentei, quantos rapazes já vieram e foram...Felizes, tristes e gentis. Certo, foram muitos mais os sambas do que os rapazes! Mas os sambas sempre me ajudaram a pensar melhor na vida. Não só os sambas, mas principalmente eles. Não faz tanto tempo, talvez há uns 4 anos, fui com meu pai a uma apresentação do Trio Madeira Brasil (que aliás, anda sumido). E eles tocaram, a moda do choro, Fuga y Misterio, do Piazzola. Foi a primeira vez que eu ouvi aquela música. Estava mal, muito mal. Saindo de um relacionamento intenso e importante. Naquele período de sofrimento profundo. Mas, ao escutar aquela música, de repente a dor se anuviou! Como se fosse mágica. Meu pai estava presente também quando fomos ao show do Elomar. A primeira vez que eu o via ao vivo! Indescrítivel. Nele está representado o meu eu mais profundo. O meu eu filha de nordestinos, o meu eu estudiosa da Idade Média, o meu eu lírico, o meu eu preocupado com a pobreza e a grandeza do meu povo.
Na minha concepção, não há arte mais sublime do que a música. Também nunca me esquecerei do show do REM no Rock´n´Rio. Fiquei rouca por uma semana, as pessoas se afastavam de mim de tanto que eu gritava as músicas! Shows marcantes foram também os do Cake, e do espetacular Dave Matthews no Free Jazz. E todos, TODOS, do Los Hermanos. Principalmente o no. 500, com o Toranja. O do Canecão, que eu fui com minha mami. No Canecão vi também meu primeiro ( e até agora, único) show do Chico, em Paratodos. Antônio Nóbrega, com quem tomei aulas, de quem eu era constante tiete.
Em shows, apesar do meu ódio eterno por multidões, me sinto inteira. Completamente integrada comigo mesma. Não sei se é o escuro ou a presença infalível da música.
Mas nada, nada, me dá uma alegria mais gratuita do que ir ao Carioca da Gema, ou ao Centro Cultural Carioca, ou a qualquer outro lugar onde se toque samba de verdade (detesto a expressão muderna "samba de raiz"). Está tudo ali: a verdadeira empolgação por se fazer, cantar, tocar e escutar samba. Infelizmente, como boa rabugenta que sou, me cansei de frequentar esses lugares porque de repente eles começaram a ser frequentados por gente que não estava no clima. Por profanadores de templo! Mas quando dá aquele aperto no coração coloco aqui minhas musiquinhas e sigo sentimento a mais transcendete alegria!

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