Wednesday, September 20, 2006

IRENE

Irene era uma moça complicada. Tanto quanto sua xará, imperatriz bizantina forte e assombrada por ter mandado cegar seu próprio filho. Nossa Irene, a atual, também era assombrada, mas por ter, repetidamente, frustrado suas chances de ser feliz. Ela mesma sabia disso. Dizia sempre: "tenho um contrato com a dor". Mas não rompia esse contrato. Parecia aos mais próximos que gostava mesmo de sofrer. Temos todos, em maior ou menos grau, o hábito de nos vitimizarmos. Mas Irene era refém de si mesma. É bem verdade que não temos como julgar se uma pessoa é infeliz porque quer, ou porque a vida se lhe apresenta sempre injusta. Mas, e isso se pode dizer com certeza, Irene se enredava com frequência em situações sem futuro. E o pior, fazia isso conscientemente.
No entanto, a alma de Irene era muito maior do que sua vida. A força que guardava dentro de si, embora menosprezada, era-lhe um peso, pois gritava para ela todos os dias que a vida não podia ser assim. A alma queria sempre se libertar das amarradas que a própria Irene lhe impunha. E por mais que seus amigos lhe implorassem, e até perdessem a calma de vez em quando, Irene não os escutava nunca. Eles rogavam a ela que deixasse aquela vida de lamúrias, que quebrasse o círculo vicioso de infelicidades, de relacionamentos doentios, e se voltasse para o que de melhor havia nela. Mas tão acostumada com a dor estava, que lhe parecia impossível romper os muros da angústia.
Mas a esperança de todos é que um dia ela perceba, e que este dia seja breve, que sua alma merece coisa melhor do que a vida que ela insiste em levar.

1 comment:

Pritchan said...

EXCELENTE! Não tenho nem o que acrescentar nesse comentário! Excelente! Cara... excelente!